“Não é que eu esteja
procurando no infinito
A sorte pra andar
comigo.”
É só uma ajuda da tecnologia.
Um supermercado de
sentimentos.
As dicas e os pontos de
vista ao alcance dos dedos.
Meirinha é manicure.
Procura todos os dias
com as unhas bem pintadas o maior amor
do mundo na tela pequena do celular.
centenas de fotos e
bigodes e óculos se apresentam.
Quase toda semana ela
encontra um grande amor que não
dura duas mensagens.
Não quer ninguém com
mais de cinquenta anos.
Tem medo de ficar viúva.
Contou isso enquanto
trabalhava e uma cliente perguntou se ela afinal sabia quando iria morrer.
- não.
- então não faz diferença
Meirinha.
Na verdade nada fazia
muita diferença e esse era o problema.
O Tinder tem muita
gente parecida .
Ela não reclama. No século
passado era muito pior e parece que foi ontem.
Bilhete no guardanapo
de papel que o garçom entregava.
Meirinha já respondeu
um com lápis de sobrancelha.
Deixou telefone de casa
e do serviço.
O rapaz ligou na hora
errada umas duas vezes
mas teve perseverança e
ligou até dar certo.
Ficaram juntos muito
tempo.
Do dia do bilhete ate o
dia de ir embora foram uns sete ou nove anos.
Mas isso também já faz
muito tempo. De lá pra cá Meirinha conheceu mais rapazes do que todas as suas
primas de Piracicaba juntas.
Jefinho que era
patinador, Geraldo que era mestre de obras,
Um dono de loja de
azulejo antigo, um colecionador de selos.
Aprendeu que os
paulistanos dão só um beijinho no rosto, os cariocas dão dois e os mineiros, três
pra casar. Se acostumou com sotaques mas
não se acostumou com ninguém do seu lado e vice versa.
Ficou meio esquecida do
Tinder quando comprou seu primeiro carro. Um corsa vermelho dois mil e sete
amassadinho na porta que nem dava pra ver.
O moço do posto de gasolina
reparou;
- o que aconteceu dona?
- ela nem tinha visto
aquele amassado. Ficou encantada com o carro na loja e combinou depressa as 72
parcelas e saiu com ele encantada e
quase sem gasolina. Aos trinta e nove anos era a primeira vez que parava em um
posto de gasolina pra abastecer.
Era também a primeira
vez que sentia aquilo. Calafrio misturado com boca seca e mão molhada. O
frentista em pé olhando pra ela com um sorriso breve.
Os dois se olhando e entendendo que era tudo igual.
Mesmo sem saber
exatamente o que.
- vai calibrar o pneu?
Meirinha não ia e nem
sabia se precisava.
Mas foi e descobriu o
maior amor do mundo.
No posto de gasolina.
Terça feira as cinco
horas da tarde.
Quando não esperava
nada e nem sabia de um amassadinho na porta que quase ninguém repara.