segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

quando o telefone não toca



Tinha um tempo em que o telefone tocava.
Agora existe um outro tempo.
O telefone acende, treme, canta, inflama, insiste.
Mas pra quem espera faz pouca diferença.
O silencio do telefone  não tem variáveis.
É  silencio e pronto.
Difícil enxergar o problema de um telefone que não toca.
Tantas tecnologias pra perceber e  mesmo assim um tanto de olhares pra se confundir sempre.
O calor desses dias, a chuva das aguas de março, os meteoros cruzando o céu da Rússia, o transito, o arroz com feijão
é tanta coisa pra falar assim sem  respirar e disfarçar tanta espera que nem dá pra imaginar como seria se o telefone não fosse tão mudo assim.

Mas o telefone não toca.
Se fosse possível pelo menos perguntar de novo as mesmas coisas de antes, escrever de novo tudo aquilo de antes, reinventar um mapa astral,
reencontrar sem querer na esquina.
Mas tudo que que tinha que ser feito já foi.
O tempo de falar já foi
e é por isso que não adianta ligar.

Agora é preciso escutar o telefone tocar.
Existem poucas razoes pra acreditar e passar tardes inteiras pensando em um numero que insiste em não aparecer na tela pequena do celular.

Acreditar que sim é a parte mais difícil do não.
Traiçoeira esperança

O sorriso daquela ultima vez, a despedida naquela festa, a falta de jeito, o suor na palma da mão, o coração disparado.

E já que o telefone não toca é impossível saber se esses arrepios são de um ou são de dois.

Você desconfia, você acha, você tem quase certeza absoluta que esse caso é pagina virada.
Mas suspira e lembra que nesse mundo de cores e nomes 
entre o preto e o branco,
existe uma escala inteira de cinza.





sábado, 16 de fevereiro de 2013

ciúme é um problema do ciumento




Tome cuidado com o que você quer saber.
Você sabe mesmo o que quer perguntar?
Quanto te verdade você deseja?
De longe as historias de amor partido e perdido
são quase todas iguais.
As frases feitas também;
Bola pra frente, a vida segue, a fila anda.
Tudo é teoria e pratica.
Teoria é ouvir
Pratica é sentir(na pele) as vezes na alma.

Pode falar. Estou pronto pra ouvir.
( mentira pura. Pronto nada)
quem é que se apronta pra isso?
E então você não ouve.
Se afasta dos territórios, das cidades e dos planetas que te fazem lembrar daquela historia que não é nem mais um quadro na parede.
Você só não sabe porque continua doendo tanto.
Nem Drummond saberia.
Mas e aí?
Você perguntou.
Quer saber?
Sempre tem gente que sabe bem do seu lado.
Amigos comuns que a vida fez e desfez e que volta e meia dizem;
Ops.
-Desculpa, não sei não vi, nem reparei.
É mentira.
A verdade é que vida realmente segue adiante e não dói pros outros. 
Só dói pra você.
E esse é um problema que é só seu.
Ninguém repara.
nem mesmo ela.

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

não adianta nem tentar




Quanto tempo dura o amor depois que acaba?
Que dia isso tudo passa?
Não existe manual de instruções nem tomada pra desligar.
Pode ser uma chuva, uma cadeira quebrada no lixo da esquina.
O amor inteiro pode ter ido pro lixo.
Sujeira escura de paixão estragada,
casca nojenta de ar condicionado sujo.
Já viu?
Crosta na dobra da porta já viu?
Amor estraga, perde a validade.
E as vezes acontece;
Não passa.
Se fosse matéria orgânica,
se fosse visível
se pelo menos fosse gente.
Não mais.
Quando acaba, o amor não é mais nada. 
Não tem endereço nem sobrenome 
nem letra grande nem miúda nem torta.
Vem outro amor,  vem um monte de arrepio e um tanto de sábado.
E é tudo verdade.
Mas existe um espinho no meio do pé
que as vezes cisma de doer quando amanhece o dia.
Fascite plantar dizem os médicos.
Esporão dizem os que não são médicos.
Já viu?
Não tem jeito de ver.
É um espinho que não é espinho.
É um nervo que encurta  a sola do pé
é uma dor que aparece
e quando opera nem o medico sabe dizer com certeza se a dor vai desaparecer.
esse espinho não existe.
É um nervo que encurta o pé e cisma de doer demais.
E não adianta nem tentar
Não é  espinho
Nem é  amor.




terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

o breve espaço do tempo das goiabas




Goiaba é  uma  fruta abençoada.
A frase é de um poema da Adélia Prado.
Mas a goiaba pode ser de qualquer um.
Nesses tempos fevereiros é fácil perceber
Que tem goiabeira demais da conta por aí.
Quem prestar atenção no caminho de todo dia vai se
Surpreender.
Nunca conheci ninguém que soubesse dizer se a goiaba é vermelha ou branca só olhando a arvore. Mas isso não faz diferença.
O bicho da goiaba também não faz diferença.
Importante mesmo é o encontro.
É o achar.
É o tempo generoso delas.
Descobrir as goiabeiras carregadas é um jeito de entender que a vida passa pra todo mundo.
Em qualquer lugar.
Aqui em São Paulo descobri um tanto delas;
tem uma na porta de casa, outra na rua Ministro Rocha Azevedo, outra na esquina da Brasil com Rebouças e outras varias na Sumaré.
Quem passar pode pegar quantas goiabas quiser.
Pode levar pra fazer doce, pode levar pra namorada,
pode esticar o braço, pode subir no pé,
pode balançar o galho.
Mas isso não é pra sempre. O tempo delas também  passa muito rápido. Vai ate o dia de São José;
dia dezenove de março.
Chove muito nesse dia. É a enchente das goiabas.
É o dia em que elas vão embora.
As maduras  demais caem no chão, as verdes também, as outras também.
A enxurrada leva tudo.
No dia seguinte termina o verão e começa o outono.
O equinócio de outono, quando noite e dia passam a ter o mesmo tempo e a rota do sol cruza a linha do equador.
Tudo cabe no breve espaço do tempo das goiabas.

O poema da Adélia Prado termina assim;
O reino é dentro da gente.


segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

a comida de avião e o fim das coisas.


O sorriso da aeromoça é maior do que o  embrulho prateado que ela te entrega.
Na melhor das hipóteses é um pãozinho humilde com presunto ou queijo.
Pode ser de manhã de tarde ou de noite.
Suco, agua ou refrigerante? O cardápio cabe na pergunta.
Não importa o destino nem a distancia.
Exercício de culinária breve.
Nem sempre foi assim.
Comida de avião já foi muito boa, dizem os mais velhos e os mais jovens  também.
Arroz, carne, salada e vinho com talheres de verdade.
É difícil dizer exatamente quando o almoço virou biscoito.
As explicações são técnicas e cheias de planilhas de custo.

Não é só a comida de avião que já foi melhor.
A vida também.
A qualidade do ar, a lataria dos carros, o tamanho dos apartamentos, a quantidade de arvores,   
a tranquilidade das ruas.

Em silencio muda o tempo.
Não faz nenhum barulho esse ritual de perdas e danos da vida moderna.
Movimento sem volta tão invisível quanto o avanço do mar que conta as décadas em centímetros.
não podemos mais voltar pra casa caminhando de madrugada depois de uma festa no bairro ao lado.
Antes podia. Agora não.
A maquina  fotográfica, o telefone celular e ate a banca de revista. Tudo ficou melhor.
A parte visível do mundo melhorou.
A invisível é que piorou. E não existe volta.
Os apartamentos de quatro quartos e quarenta metros quadrados vão ficar menores ainda
A cerveja de garrafa vai ficar cada vez mais cara,
o ar vai ficar pior, a vida vai ficar pior.
Além da comida de avião uma lista de pequenos itens
Segue o rumo do fim.
No escuro da ultima fileira um corvo grita; Nunca mais, Nunca mais.





domingo, 10 de fevereiro de 2013

do fundo da geladeira




Treze de novembro de dois mil e oito.
A letra miúda na tampa branca da ultima prateleira na geladeira que também é branca.
A corajosa geleia de morango de nome difícil que veio
Da Bélgica e que nunca foi aberta.
Venceu o tempo e os novembros e depois se perdeu.
Deixou de ser orgânica, virou enfeite e depois deixou de ser objeto.
Virou um sentimento.
Meu Deus do céu, como dói essa geleia de morango que veio da Bélgica
e que entregou seus últimos pontos em um verão de dois mil e oito.

Morreu a espera de um café da manhã perfeito na mesa de um sábado ao lado flores bonitas.
Passou a vida esperando um sim, eu quero muito.
Um tanto.
A frase nunca foi dita.
A geleia foi e voltou da mesa pra geladeira
E da geladeira pra mesa e vice versa.
Muitos sábados se passaram
e muitos cafés da manha ficaram de noite e começaram e terminaram.
E ela na mesa voltava sem ouvir nenhum sim.
Nem ela nem ninguém ouviu nenhum sim.

Naquele tempo de antes, dois mil e oito era  um dia que ainda demorava muito pra chegar. Dava pra acreditar em muita coisa ate o dia treze de novembro de dois mil e oito.
Mas agora não.
Ela fica ali no cantinho.
Tímida,
invalida,
morta.
Só pra lembrar a vida inteira que poderia ter sido
Se alguém tivesse dito;
Sim.
Eu aceito.


  

sábado, 9 de fevereiro de 2013

mas ele sobreviveu


Ela tinha unhas cuidadosas.
O perfume  sempre o mesmo.
E provocava sempre o mesmo calafrio em quem quer que fosse.
Principalmente nele, tao completamente apaixonado por ela.
Tinha um jeito de jogar o cabelo do lado e o ombro pra frente que era uma coisa.

O shampoo  era Londrino; Burberry.
A bolsa Fendi custava o preço de um carro e as joias da Tiffany um apartamento de três quartos.   

mulher de muitos valores.

Fácil se acostumar com tanto luxo.
Homem mediano. nem bonito nem feio.
Mas nesses dias; muito chique.

 Ele conheceu suas calcinhas finas com tirinhas de oncinha.
seu patuá de cristal  com sal grosso que ficava dentro do soutien e que um dia ficou esquecido na cômoda do lado da cama dele.  

E tao inesperadamente como começou
aconteceu também de terminar.

Sem grandes motivos nem maiores prantos pra ela
mas pra ele um tsunami .                                                               

Tudo que era suavidade e sofisticação no tempo bom de antes tinha agora aquela dor.
Sem nome.

madeleyne  peyroux cantando “dance me to the end of love”,
Restaurantes de três silabas e trinta reais pra estacionar, vitrines e filmes e livros.

Era  imensa a lista de motivos pra cortar os pulsos ouvindo fado e lendo Florbela Espanca.

Mas ele sobreviveu.

E alguns sábados depois ouviu em uma conversa de bar alguma coisa sobre o poder transformador do investimento em boas cuecas.
Mesmo na seca mais terrível na entressafra mais aterrorizante uma boa cueca  é fundamental.
Seja como fator de redução de danos ou elemento surpresa  ou simplesmente para melhorar a auto estima lá por baixo.

E ele nao foi comprar as cuecas novas na Oscar Freire, como iria se estivesse com ela.
Foi na 25 de Março e gastou  780 reais. 48 modelos diferentes .11 cores e 6 meses  de cuecas surpreendentes na gaveta do guarda roupa.
Voltou pra casa radiante e nao era só por causa das cuecas novas.

Era por causa da moça do caixa do armarinho Sao Jorge.
Tinha um colar com a letra G em douradinho descascado. Se chamava Geralda. Igual a Geraldine Chaplin ele disse.
- Quem?
-Nada nao.
As unhas eram bem desarrumadas e as mãos eram sujas de papel carbono e tinta de caneta. Usava uma melissa com as tiras do pé direito arrebentadas e  sujas de poeira e barro. Deu pra ver o calcanhar rachado e também pra reparar nas gotinhas de suor entre o nariz e os lábios. Ele preferia nao ter percebido mas no primeiro suspiro sentiu aquele característico cheiro do ultimo aviso de desodorante quase por vencer.  Mas nessa hora era ele que ja estava vencido. Ele tinha olhado e nao conseguia mais parar de olhar;
pras pernas dela. Pra bunda dela. Pra ela.
Alguma coisa aconteceu ali;
 nessa hora ele se lembrou de uma musica que falava da reunião do ceu e da terra antes do ocidente se assombrar. Ela também nessa hora pensou em uma musica;
‘eu quero ver voce correndo atrás de mim, eu quero ver você correndo atrás de mim, agora eu quero ver você correndo atrás de mim.’’
-Avioes do forró. Conhece?
-Nao. Mas se vou conhecer.
E conheceu mesmo e achou que o gingado era bom e depois conheceu Jorge de altinho, calcinha preta, as pegadinhas do muçao e achou tudo muito lindo. e ela achava cada cueca dele a coisa mais bonita do mundo. principalmente as de  cores fortes e  fosforescentes. Nunca mais ouviu madaleyne, nem recitou mario benedetti. Comprou um cinto personalizado de dupla fase. E usa uma pochete com o maior orgulho. Nao é feliz. Mas vive em paz!