sábado, 9 de fevereiro de 2013

mas ele sobreviveu


Ela tinha unhas cuidadosas.
O perfume  sempre o mesmo.
E provocava sempre o mesmo calafrio em quem quer que fosse.
Principalmente nele, tao completamente apaixonado por ela.
Tinha um jeito de jogar o cabelo do lado e o ombro pra frente que era uma coisa.

O shampoo  era Londrino; Burberry.
A bolsa Fendi custava o preço de um carro e as joias da Tiffany um apartamento de três quartos.   

mulher de muitos valores.

Fácil se acostumar com tanto luxo.
Homem mediano. nem bonito nem feio.
Mas nesses dias; muito chique.

 Ele conheceu suas calcinhas finas com tirinhas de oncinha.
seu patuá de cristal  com sal grosso que ficava dentro do soutien e que um dia ficou esquecido na cômoda do lado da cama dele.  

E tao inesperadamente como começou
aconteceu também de terminar.

Sem grandes motivos nem maiores prantos pra ela
mas pra ele um tsunami .                                                               

Tudo que era suavidade e sofisticação no tempo bom de antes tinha agora aquela dor.
Sem nome.

madeleyne  peyroux cantando “dance me to the end of love”,
Restaurantes de três silabas e trinta reais pra estacionar, vitrines e filmes e livros.

Era  imensa a lista de motivos pra cortar os pulsos ouvindo fado e lendo Florbela Espanca.

Mas ele sobreviveu.

E alguns sábados depois ouviu em uma conversa de bar alguma coisa sobre o poder transformador do investimento em boas cuecas.
Mesmo na seca mais terrível na entressafra mais aterrorizante uma boa cueca  é fundamental.
Seja como fator de redução de danos ou elemento surpresa  ou simplesmente para melhorar a auto estima lá por baixo.

E ele nao foi comprar as cuecas novas na Oscar Freire, como iria se estivesse com ela.
Foi na 25 de Março e gastou  780 reais. 48 modelos diferentes .11 cores e 6 meses  de cuecas surpreendentes na gaveta do guarda roupa.
Voltou pra casa radiante e nao era só por causa das cuecas novas.

Era por causa da moça do caixa do armarinho Sao Jorge.
Tinha um colar com a letra G em douradinho descascado. Se chamava Geralda. Igual a Geraldine Chaplin ele disse.
- Quem?
-Nada nao.
As unhas eram bem desarrumadas e as mãos eram sujas de papel carbono e tinta de caneta. Usava uma melissa com as tiras do pé direito arrebentadas e  sujas de poeira e barro. Deu pra ver o calcanhar rachado e também pra reparar nas gotinhas de suor entre o nariz e os lábios. Ele preferia nao ter percebido mas no primeiro suspiro sentiu aquele característico cheiro do ultimo aviso de desodorante quase por vencer.  Mas nessa hora era ele que ja estava vencido. Ele tinha olhado e nao conseguia mais parar de olhar;
pras pernas dela. Pra bunda dela. Pra ela.
Alguma coisa aconteceu ali;
 nessa hora ele se lembrou de uma musica que falava da reunião do ceu e da terra antes do ocidente se assombrar. Ela também nessa hora pensou em uma musica;
‘eu quero ver voce correndo atrás de mim, eu quero ver você correndo atrás de mim, agora eu quero ver você correndo atrás de mim.’’
-Avioes do forró. Conhece?
-Nao. Mas se vou conhecer.
E conheceu mesmo e achou que o gingado era bom e depois conheceu Jorge de altinho, calcinha preta, as pegadinhas do muçao e achou tudo muito lindo. e ela achava cada cueca dele a coisa mais bonita do mundo. principalmente as de  cores fortes e  fosforescentes. Nunca mais ouviu madaleyne, nem recitou mario benedetti. Comprou um cinto personalizado de dupla fase. E usa uma pochete com o maior orgulho. Nao é feliz. Mas vive em paz!







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